Em primeira análise destacamos o número total de mulheres reclusas no estado do Acre. São 231, dentre elas, 193 estão reclusas em Rio Branco, 17 em Cruzeiro do Sul e 21 em Tarauacá. No Estado do Acre 346 mulheres estão em regime aberto e semiaberto, sob Monitoramento Eletrônico Penitenciário.
A seguir veremos detalhadamente como é a estrutura física dos presídios femininos do Acre, assim como o suporte logístico e humano existente, para garantia dos direitos fundamentais e humanos dessas mulheres, pois sabe-se que todos são iguais perante a lei, e com isso o Estado deve garantir os mesmos direitos oferecidos às mulheres em liberdade, também às mulheres presas, pois, ainda que estejam presas pelo cometimento de atos ilícitos, continuam cidadãs brasileiras detentoras de direitos inerentes à pessoa humana. Nesse contexto de humanização da mulher reclusa, o presente artigo dará ênfase na pesquisa e coleta de dados a partir do Presídio Feminino Guimarães Lima, localizado em Cruzeiro do Sul-AC, e trataremos da importância de um ambiente prisional inclusivo, com espaços adequados para acolher os familiares das mulheres reclusas e para o exercício de políticas públicas eficazes, com a finalidade de qualificar profissionalmente essas mulheres, não retornem às penitenciárias.
Ao iniciarmos a fase de pesquisa e produção do presente artigo, nos deparamos com uma realidade que pouca gente conhece. O que passaremos a abordar, tendo como referência o presídio de Cruzeiro do Sul, conforme a seguir:
Em relação aos ambientes físicos, o presídio de Cruzeiro do Sul, consta com celas que medem 5 m² (cinco metros quadrados), e tem capacidade para acomodar 2 mulheres. Porém, normalmente as celas acomodam 4 mulheres.
Outro fator relevante, é que com o advento das facções criminosas no estado do Acre, os presídios tiverem que se adequar à nova realidade, e passaram a separar as presas de acordo com a “bandeira” das respectivas facções que integram, ou em bloco neutro, caso a mulher reclusa não integra nenhuma facção criminosa. Nos prédios dos presídios acreanos, há também a possibilidade de cultuar a religião declarada pelas presas, e blocos destinados a essas mulheres, que é conhecido como o bloco da “benção”, e se refere às mulheres presas que estão decidindo seguir uma religião.
Foi observado também, locais destinados à recreação, como campo de futebol, quadra de vôlei de areia, e área para banho de sol.
Outro espaço que chamou a atenção foi o setor de artesanato, onde as presas confeccionam produtos artesanais, e inclusive podem revender. Além disso, de acordo com a Lei de Execuções Penais brasileira, a cada três dias trabalhados, será remido um dia de pena.
Passando a análise do material humano de suporte às mulheres encarceradas no Acre contam com uma equipe multidisciplinar, composta por psicólogas, assistentes sociais, pedagogas, policiais penais femininas, agentes penais administrativos, entre eles motoristas, enfermeiros, digitadores, entre outros.
Fazendo uma análise pormenorizada do presídio feminino de Cruzeiro do Sul, observamos que este consta com 1 psicóloga, 1 assistente social, 1 pedagoga e 6 policiais penais femininas, além de 5 agentes administrativas. Contudo, no presídio de Cruzeiro do Sul, encontram-se 16 mulheres encarceradas, atualmente. Assim, nota-se que a quantidade de profissionais não é suficiente para atender a demanda das presidiárias, principalmente quando é necessário realizar escolta de presa ao serviço público de saúde, à audiência no fórum, e ainda proporcionar o direito às detentas ao banho de sol, as visitas familiares. Nos dias destinados às visitas íntimas e familiares, principalmente quando as visitas familiares envolvem crianças menores, o acompanhamento de uma assistente social e uma psicóloga seria de grande relevância nessa modalidade de visitas, buscando minimizar os danos físicos e psicológicos impostos às crianças que têm suas mães retiradas do convívio familiar pelo aprisionamento. Com o intuito de mitigar os efeitos dessa ruptura familiar, o Estado precisa criar políticas públicas que atendam os familiares de mulheres encarceradas, direcionado principalmente às crianças e seus cuidadores, que na sua maioria são idosos, que diante da ausência da mãe passam a cuidar de seus filhos. O monitoramento e apoio desses familiares por uma equipe multidisciplinar causaria impactos positivos no que tange ao as relações sociais desses familiares, diminuindo problemas escolares dessas crianças, trabalhando diretamente nos problemas psicológicos e comportamentais desses familiares.
Diante desse cenário, chegamos ao núcleo do que trata este artigo. As mulheres encarceradas no Estado do Acre.
Passamos a analisar o perfil destas mulheres. 90% das mulheres encarceradas no Acre tem entre 20 e 35 anos, possuem ensino fundamental incompleto, são negras e pobres.
Os outros 10% estão distribuídos em mulheres de 35 a 45 anos, com ensino médio incompleto, de pele clara e de classe média baixa.
Outro dado coletado é que 60% das mulheres presas respondem pelo crime de tráfico de drogas, 20% respondem pela integrar organização criminosa, 10% pela prática do crime de roubo, 5% por cento pela prática do crime de furto, e 5% por homicídio.
Independente do crime que cometeram essas mulheres a cada mês menstruam, sentem saudades de seus familiares, pais, filhos, esposos, companheiros, namorados, parentes e amigos. Contudo, curiosamente, diferente dos presídios masculinos, o índice de visitas íntimas às mulheres encarceradas no Acre é de 1%. O que por vezes, faz com que muitas dessas mulheres se sintam desprezadas e mais humilhadas ainda.
Outro fator que foi considerado alarmante, é que 95% das mulheres presas no Acre, por tráfico de drogas, são desempregadas ou dependem financeiramente dos maridos ou companheiros, para sustentarem os filhos, e 90% das presas já sofreram violência doméstica ou familiar por parte desses mesmos maridos ou companheiros.
Destacamos que não temos intenção de justificar a prática criminosa. Todavia, notou-se em geral, um perfil de mulheres sem instrução acadêmica, com filhos pequenos, sem trabalho, pobres, negras, sem estrutura familiar, dependentes emocional e financeiramente de homens, que também não possuem renda fixa, nem instrução acadêmica e em sua maioria violentos e em conflito com a lei.
Quando os primeiros presídios foram construídos, o intuito era a contenção de criminosos do sexo masculino, as criminosas do sexo feminino eram internadas em conventos, por serem de menor potencial ofensivo, suas penas e correções eram feitas pelas ordens religiosas à que estavam subordinadas. Com o aumento da comunidade presidiária feminina, as mulheres foram direcionadas para cumprirem suas penas nos presídios construídos para presos do sexo masculino. Desde então esta é a realidade dos presídios no Brasil, as estruturas físicas dos presídios não foram construídas para propiciar o vínculo familiar, especialmente nas relações entre mães e filhos. São tantas as discrepâncias no ambiente prisional feminino, que mostraremos neste artigo de opinião somente algumas delas, tratando especificamente no Estado do Acre.
As principais questões relacionadas à essa falta de adequação dos espaços físicos do presídio para o sexo feminino, desde o momento que estas detentas entram em estado puerperal, ao parirem seus filhos dentro dos presídios e não poderem contar com um espaço digno para o seu estado e da criança, recém-nascida. O desastre dessa falta de planejamento causa sequelas emocionais naquela mulher e consequente no recém-nascido. O processo de danificar emocionalmente esses indivíduos se estende pela ausência de espaços para que as detentas recebem a visita dos seus filhos, crianças que adentram o sistema prisional. Esta falta de espaços adequados para que as mães recebam essas crianças, enquanto cumprem suas penas, preocupa os psicólogos e assistentes sociais dos presídios. Os vínculos e laços maternos precisam ser respeitados e incentivados pelo Estado, e a falta de políticas públicas que protejam esse direito, tanto da mãe encarcerada, como da criança abandonada emocionalmente, deixa uma ferida social onde a cura é inalcançável, no retorno futuro dessas mães ao convívio com esses filhos, e destes com a sociedade que os privou de criar laços com suas mães.
Para evitar que essas mulheres voltem ao sistema carcerário, o estado criou políticas públicas para o empoderamento feminino através da qualificação profissional. Um exemplo dessas políticas públicas está no programa “Todas Elas”, uma parceria público-privado entre o IAPEN, o Ministério Público Estadual, a Receita Federal, a FIEAC, a Secretaria Estadual da Mulher que tem como finalidade a formação e capacitação das reeducandas do Presídio Feminino Guimaraes Lima. A FIEAC através do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial - SENAI, assume o compromisso de fornecer educação e formação profissional no curso de Costureiro Industrial. As instituições parceiras acompanham e fornecem os insumos para que as reeducandas possam se profissionalizar e fazer a remissão de suas penas. Esse projeto tem por objetivo resgatar e devolver a dignidade à essas mulheres através da qualificação profissional, oportunizando a abertura de pequenas empresas, a criação de emprego e a reinserção dessas mulheres no mercado de trabalho.
Uma nova comunidade carcerária surge na atualidade, são os presos transgêneros, com a necessidade do encarceramento de acordo com suas peculiaridades, áreas separadas e tratamentos hormonais, já previstos na legislação, mas sem aplicação. Problemas como a homofobia e a falta de adequação do sistema para receber esses presos(as), é um grande gargalo para o sistema prisional nacional. Os Estados se omitem no tratamento digno com esses detentos(as), não construíram novos presídios para essa demanda, fazem o famoso “jeitinho brasileiro”, destinam alas ou conjuntos de celas separadas dentro dos presídios, onde os presos(a)s sofrem agressões físicas e psíquicas, outros problemas são a violência de gênero e a gravidez destas custodiadas.
CONCLUSÃO
Portanto, através dos dados colhidos e da pesquisa empírica realizada para elaboração do presente artigo, conclui-se que o encarceramento feminino no Acre tem aumentado, e uma das causas é a falta de políticas públicas eficazes no sentido de oferecer mais oportunidades de trabalho lícito para que mulheres que hoje encontram-se presas ou sejam egressas do sistema carcerário, não voltem ao sistema prisional, bem como no sentido de evitar outras mulheres venham a fazer parte das estatísticas de mulheres presas no Acre. Dessa forma, o poder público em parceria com instituições engajadas na defesa dessa problemática, deve fomentar e incentivar políticas de empoderamento feminino pelo trabalho lícito, através de programas de capacitação e qualificação profissional em ramos diversos da atividade empresarial, incentivando o empreendedorismo e a criação de pequenas e médias empresas, bem como incentivando o setor empresarial com redução de impostos para os que receberem em suas empresas, mulheres egressas do sistema penitenciário do Acre, visando o resgate da dignidade dessas mulheres, o que é inerente à pessoa humana, mas que a rotulação e o preconceito tem tirado das mulheres, esse direito, que é fundamental e também é um direito humano. Dessa forma, poder-se-á afirmar que o estado democrático de direito, de fato ainda subsiste em meio a tanta injustiça e segregação, não só do corpo, mas da dignidade de mães, filhas, esposas, companheiras, namoradas ou irmãs que se encontram encarceradas nos presídios do Acre.
REFERÊNCIAS
Macleine Paula de Melo - Psicóloga, atualmente responde pela Ouvidoria Penitenciária do Acre
Nayana Najhara Bessa Neves - Assistente Social servidora do IAPEN - Penitenciária Manoel Nery da Silva
Maria José da Silva Morais Costa - Professora do Curso de Direito da Universidade Federal do Acre, Coordenadora do Projeto Presídios Leitores
Artigo: Guerreiras do cárcere: uma rede virtual de apoio aos familiares de pessoas privadas de liberdade. Barcinski, Mariana, Lermen, Helena Salgueiro, Campani, Cristiane, & Altenbernd, Bibiana. (2014). Temas em Psicologia, 22(4), 929-940.
LIVRO: AS MUITAS MARIAS - Histórias sobre o Encarceramento Feminino. Autor: Ludmila Ribeiro; Ana Beraldo; Isabela Araújo; Isabella Silva Matosinhos; Lívia Bastos Lages; Luana Hordones Chaves; Natália Martino; Thais Lemos Duarte. Edição: 1ª. Ano: 2022.
OS AUTORES
Janaina Verbena Gonçalves Terças é CEO da Indústria Cerâmica Terças, Assistente Social, Dama Comendadora da Amazônia – Câmara Brasileira de Cultura, Coordenadora Institucional da Federação das Indústrias no Juruá e Coordenadora do Sicredi Biomas.
Diogenes Ramos Maciel é Técnico Judiciário - Tribunal de Justiça do Estado do Acre, Estudante do 8º Período do curso de Direito da Universidade Federal do Acre, Licenciado em Letras Inglês pela Universidade Federal do Acre, Pós-graduado em Direito, Administrativo pela Faculdade Nova Venda do Imigrante – FAVENI, Pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal pela Faculdade Nova Venda do Imigrante – FAVENI, autor de artigo cientifico publicado em revista qualis B1: CASSOL, S.; MACIEL, DR O PROCESSO ELETRÔNICO VERSUS O PROCESSO FÍSICO NO ÂMBITO DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO ACRE. Revista Contemporânea , [S. l.] , v. 8, pág. 13240–13259, 2023. DOI: 10.56083/RCV3N8-178.
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